Quem não senti não vê...

        

         De quem é a razão? É de quem pegar primeiro, a culpa fica a mercê dos atrasados. Para esses, não existe o certo e o errado.
        Ana governava seu mundo, pesando, medindo, calculando. Até se ‘apaixonar’ e descobrir que chegar atrasada na lei da vida, é igual a dias sem dormir, a olheiras, aperto no peito, Daí, Ana nem pesava nem media, ela só contava, os dias, as horas, os minutos.

          Já acordada antes do nascer do sol, ela ofegava e enumerava os antigos pesadelos, antigos porque já passaram. Ana não podia preencher mais o presente, estava apinhado demais de coisas que não podia transformar em passado, então mentalmente amassava e queimava os medos fictícios, levantava-se e caminhava até o espelho para encarar seu medo real. As pessoas tentavam acalentá-la, acalmá-la com frases feitas, ela se perguntava quando as coisas se organizariam? Quando as coisas cessariam a ponto de não ter receio de olhar o futuro em portas abertas, e não espiando pela fresta? Tudo lhe fora arrancado, a inocência inventada, o futuro planejado, o sorriso despreocupado, o coração lívido. Em seu lugar a ofertaram tristeza angustia e a maldita culpa.

          De frente para o espelho contemplava o volume que começava a se formar em seu ventre, leva um susto ao sentir um leve cutucão no lugar onde sua mão afagava, pela primeira vez em meses Ana sorri de verdade, enquanto leves sentimentos felizes lhes são devolvidos.

[Poliana Fonteles]